quinta-feira, 18 de outubro de 2012

O Nariz



Por Meriam Lazaro
         Nasceu bem dotado; de inteligência, graça, pobreza e tudo mais, além de um famigerado nariz! De pequenino seu apelido, Narizinho, ganhou a rua a escola o bairro e as tias queridas que ao cumprimentá-lo apertavam-lhe o bendito apêndice. Ele sorria agradecido e arrependido dos pensamentos desajuizados.
         Já rapaz, sem que alguém gravasse ou fizesse questão de gravar seu nome, a alcunha de Narizinho não mais condizia com seu tamanho. Logo chamou atenção da mulherada e até da rapaziada aquela protuberância que, quanto mais alto crescia em estatura, caçoada e censura, mais se destacava, sendo promovido a Nariz. Sempre associado à masculinidade aquele baita nariz, namorou, namorou, namorou, noivou. Ninguém lhe desmentiu a fama. Casou-se e era agora Seu Nariz.
         Com o passar dos anos Seu Nariz se expandiu, ganhou dimensão robusta e avermelhada. De barba crescida candidatou-se a Papai Noel, pois com barba natural ganhava trezentos dinheiros a mais que os outros com barba falsa. As crianças, perversas crianças, adoravam puxar-lhe a barba e dar-lhe pancadinhas de um lado e de outro no seu nariz como se fazia com o brinquedo “João-Bobo”. Seu Nariz se submetia, pois precisava sustentar os Narizinhos de casa. Porém, quando chegava, depois do expediente, moído pela balbúrdia que reina nessas datas e atordoado pelas musiquinhas repetitivas de fazer gastar, explicava aos seus filhos que o bom Papai Noel não era uma figura mítica coisa nenhuma, mas sim o seu papai e o papai de muitas outras crianças que “ralavam” o ano todo, inclusive em época de festa.
         Seu Nariz envelheceu poroso, com bexigas e sinais trazidos pelo sol, mas sempre prosa, mirava o chão, apostava com as bochechas e as orelhas para ver quem ganharia da força da gravidade. Só foi saber que tinha alergia ao pólen naquela cerimônia, com terno bem cortado, cheirando a novo, o espírito em cócegas para espirrar diante das flores. Na carne pálida caiam lágrimas daquela que sempre o amou e lhe chamava por Nazareno, qualquer que fosse o tamanho ou o gracejo com o seu nariz.

MERIAM LAZARO reside em Porto Alegre, trabalha na área jurídica, adora música filmes livros e escreve por lazer textos livres em prosa e verso. Mantém uma escrivaninha no site Recanto das Letras.



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2 comentários:

  1. Nesse prazer que é ler você, sempre aprendendo algo de novo e eficaz! Beijos Meriam!

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  2. rsrs... Meriam, adorei seu conto. Que coisa, hein? Um simples nariz, quem diria, dando tanto o que falar... Na verdade um senhor Nariz! A ideia ficou ótima, e de um nada você fez um barulhão danado! Valeu! Abraço da Marina Alves.

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